Alguns aspectos concretos das nossas celebrações





Estas indicações representam para nós um desafio. Apresentam-se, pois, algumas concretizações que têm que ver com situações que dependem diretamente de nós ou nas quais podemos – e devemos – ajudar os outros fiéis.

O único livro litúrgico que se leva processionalmente é o Evangeliário, porque objecto de especial veneração. Não tem sentido levar solene e precessionamente o livro da Oração Universal e menos ainda a agenda com as intenções da Missa... Já quanto ao Leccionário, o seu lugar é no ambão.

O acto penitencial, apresenta uma configuração que, com frequência, não é respeitada. Segundo a Instrução Geral do Missal Romano (IGMR), o acto penitencial “é feito por toda a comunidade com uma fórmula de confissão geral e termina com a absolvição do sacerdote (IGMR 51). O centro da celebração do perdão não é esta preparação penitencial, mas a celebração da Eucaristia como tal, como afirma o próprio Jesus Cristo: “Este é o cálice do Meu Sangue, o Sangue da nova e eterna Aliança, que será derramado por todos, para remissão dos pecados”. “Ao domingo, principalmente no tempo pascal, em vez do costumado acto penitencial pode fazer-se, por vezes, a bênção e a aspersão da água em memória do baptismo” (IGMR 51). “Depois do acto penitencial, diz-se sempre o Senhor, tende piedade de nós (Kýrie, eléison), a não ser que já tenha sido incluído no acto penitencial” (IGMR 51). Trata-se de um modelo aclamativo litânico com uma invocação tripartida dirigida ao Senhor (Cristo), Kyrios, e não à Santíssima Trindade, como erroneamente às vezes se interpreta. Quando se acrescentam tropos penitenciais, o Senhor, tende piedade de nós substitui a confissão e passa a constituir o acto penitencial. Neste caso, são de evitar os discursos moralistas! Trata-se de nos reconhecermos pecadores, mas não de fazer uma confissão pública e detalhada das nossas faltas.

Na apresentação dos dons, não abusar da inserção de símbolos. Os símbolos fundamentais são sempre o pão e o vinho para a Eucaristia. São os únicos elementos necessários; todos os outros são dispensáveis! Com frequência, organiza-se uma procissão dos dons em que se pode encontrar de tudo um pouco, menos os únicos elementos que tinham de estar lá! Pão e vinho para a celebração. Não tem sentido levar um pão, que fica sobre o altar, mas que não tem qualquer relação com a celebração. O pão é aquele que vai ser consagrado. Um símbolo de um símbolo não faz sentido, mas é o que acontece quando se leva um pão caseiro para simbolizar o pão eucarístico... Se as partículas são pouco expressivas, porque muito estilizadas, mudem-se as partículas.

Outro hábito frequente, quando se pretende solenizar uma celebração, é multiplicar os símbolos. Mas como não são expressivos – dizem pouco ou mesmo nada – é preciso explicar o que são e porque os apresentamos. Se um símbolo precisa de ser explicado é porque não simboliza! E inflaciona-se a celebração com discursos tão inúteis como inadequados ao momento. Diz o papa Bento XVI, na Exortação Sacramento da caridade, n.47: “Este gesto não necessita de ser enfatizado com descabidas complicações para ser vivido no seu significado autêntico.”

Se, excepcionalmente se pretender levar outros elementos além do pão e vinho para a Eucaristia, que sejam poucos e verdadeiros: levar ofertas que não se oferecem, não tem sentido; como não tem sentido oferecer a Deus a Sua Palavra (a Bíblia), os dons do Espírito Santo...

No momento depois da Comunhão, a assembleia é convidada a dar graças pelo dom da Eucaristia recebida em comunhão. É um momento que admite várias configuração (cf. IGMR 88):

- oração pessoal, em silêncio
- expressão comum de louvor, com um cântico
- oração pessoal, em silêncio, seguida de expressão comum de louvor, pelo canto

Tenha-se, porém, presente que o grande momento da acção de graças é a Oração eucarística! Por este motivo, o Directório para as Missas com crianças diz que, quando se pretende valorizar com as crianças a atitude de acção de graças, isso se pode fazer pondo as crianças a indicar os motivos pelos quais querem dar graças a Deus depois da oração sobre os dons e antes do prefácio (n. 22)! Nâo depois da comunhão! Textos e discursos neste momento são inadequados, porque fora do lugar.

Devemos ter sempre a preocupação com o equilíbrio do conjunto da celebração. Evitar multiplicar intervenções, explicações, avisos... Não temos de dizer tudo, nem de explicar tudo!

Conclusão: os desafios à nossa maneira de celebrar

As concretizações e exemplos apresentados são apenas uma amostra, mais ou menos aleatória, de aspectos que exigem a nossa atenção e o acompanhamento dos fiéis que, com boa vontade e recta intenção, preparam estes momentos e elementos das celebrações.

Concluo com dois desafios de um antropólogo francês (J.-Y. Hameline) ao nosso modo de celebrar.

Menos símbolos, mas mais simbolização. Tendemos a multiplicar os símbolos, que passam a funcionar simplesmente como elementos de ornamentação visual, sem real capacidade de tocar os fiéis; multiplicamos os símbolos, mas eles são tão pouco expressivos que sentimos necessidade de os explicar detalhadamente, sem nos apercebermos que quando é necessário explicar um símbolo é porque ele não simboliza, não tem expressividade, é mudo e vazio. Em vez de somar símbolos aos símbolos que a liturgia já apresenta, o caminho seria de os valorizar, não de os multiplicar!

Menos discurso, mas mais actos de linguagem. A lei fundamental da liturgia não é dizer o que se faz, mas sim fazer o que se diz (L.-M. Chauvet)! Na liturgia, as palavras não são informação debitada para os ouvidos dos presentes: são acção, isto é, súplica, acção de graças, louvor... As palavras acompanham os gestos, esclarecem-lhe o sentido e realizam o que se diz: “eu te baptizo” não é uma informação que se dá, é um acto que se realiza. Tomar isto a sério implica, por exemplo, cuidar quer da qualidade do gesto, quer da adequação da entoação. Não se trata de teatralizar, mas de assumir e interiorizar.



Leiria, 24 de Maio de 2011.
P. Carlos Cabecinhas



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