Com a samaritana



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De onde vem este texto?

Tal como nas outras narrativas de João (Nicodemos, o cego de nascença, as irmãs de Lázaro, Marta e Maria), esta é também uma descoberta progressiva do mistério de Jesus. A Samaritana é o modelo daqueles/as que encontram a fé, ou que redescobrem a pessoa de Jesus, e fazem a experiência do Espírito Santo. Para além do acontecimento histórico, João faz aqui uma catequese cristã, centrada no mistério de Jesus: Ele é o Messias dos Judeus e dos outros povos, a começar pelos Samaritanos.




Naquele tempo,
chegou Jesus a uma cidade da Samaria, chamada Sicar,
junto da propriedade que Jacob tinha dado a seu filho José,
onde estava o poço de Jacob.
Jesus, cansado da caminhada, sentou-Se à beira do poço.
Era por volta do meio-dia.





Veio uma mulher da Samaria para tirar água.
Disse-lhe Jesus: «Dá-Me de beber».
Os discípulos tinham ido à cidade comprar alimentos.
Respondeu-Lhe a samaritana:
«Como é que Tu, sendo judeu,
me pedes de beber, sendo eu samaritana?».
De facto, os judeus não se dão com os samaritanos.




Disse-lhe Jesus:
«Se conhecesses o dom de Deus
e quem é Aquele que te diz: ‘Dá-Me de beber’,
tu é que Lhe pedirias e Ele te daria água viva».




Respondeu-Lhe a mulher:
«Senhor, Tu nem sequer tens um balde e o poço é fundo:
donde Te vem a água viva?
Serás Tu maior do que o nosso pai Jacob,
que nos deu este poço, do qual ele mesmo bebeu,
com os seus filhos e os seus rebanhos?».




Disse-lhe Jesus:
«Todo aquele que bebe desta água voltará a ter sede.
Mas aquele que beber da água que Eu lhe der
nunca mais terá sede:
a água que Eu lhe der tornar-se-á nele uma nascente
que jorra para a vida eterna».




«Senhor, – suplicou a mulher – dá-me dessa água,
para que eu não sinta mais sede
e não tenha de vir aqui buscá-la.



Disse-lhe Jesus:
«Vai chamar o teu marido e volta aqui».
Respondeu-lhe a mulher: «Não tenho marido».
Jesus replicou:
«Disseste bem que não tens marido,
pois tiveste cinco,
e aquele que tens agora não é teu marido.
Neste ponto falaste verdade».
Disse-lhe a mulher:
«Senhor, vejo que és profeta.
Os nossos antepassados adoraram neste monte,
e vós dizeis que é em Jerusalém que se deve adorar».




Disse-lhe Jesus:
«Mulher, acredita em Mim:
Vai chegar a hora
em que nem neste monte nem em Jerusalém adorareis o Pai.





Vós adorais o que não conheceis;
nós adoramos o que conhecemos,
porque a salvação vem dos Judeus.
Mas vai chegar a hora – e já chegou –
em que os verdadeiros adoradores
hão-de adorar o Pai em espírito e verdade,
pois são esses os adoradores que o Pai deseja.
Deus é espírito,
e os seus adoradores devem adorá-l’O em espírito e verdade».



Disse-Lhe a mulher:
«Eu sei que há-de vir o Messias,
isto é, Aquele que chamam Cristo.
Quando vier há-de anunciar-nos todas as coisas».
Respondeu-lhe Jesus:
«Sou Eu, que estou a falar contigo».



Muitos samaritanos daquela cidade acreditaram em Jesus,
por causa da palavra da mulher.
Quando os samaritanos vieram ao encontro de Jesus,
pediram-Lhe que ficasse com eles.
E ficou lá dois dias.




Ao ouvi-l’O, muitos acreditaram e diziam à mulher:
«Já não é por causa das tuas palavras que acreditamos.
Nós próprios ouvimos
e sabemos que Ele é realmente o Salvador do mundo».





Evangelho do Domingo III da Quaresma (Ano A)
Jo 4, 5-42


Reflexões de Philippe Gruson
in «Ler e rezar a Bíblia», volume 2


O Poço de Jacob
Este poço existe, ainda hoje, na cripta de uma Igreja ortodoxa inacabada, a leste de Naplouse, perto da antiga Siquém, a 2 km da velha Sicar (hoje Askar). A 35 metros de profundidade, o poço toca uma torrente subterrânea.

Os Samaritanos
São os descendentes dos Israelitas do reino do Norte (de 932 a 722 a.C.), cuja capital, Samaria, tinha dado o nome a toda a região. Os Judeus de Jerusalém censuravam-lhes o facto de se terem misturado com estrangeiros. Os dois povos viviam como irmãos desavindos.

Os cinco maridos
A mulher teria tido seis companheiros sucessivos? Também é possível que a palavra «marido» seja aqui simbólica e designe as cinco divindades pagãs dos Samaritanos (cf. 2 Rs 17,29-34).

O Monte
A vila de Siquém (Naplouse) é dominada pelo monte Garizim, ao sul.
Os Samaritanos tinham aí construído um Templo que os Judeus de Jerusalém destruíram. Ainda hoje, os Samaritanos celebram a Páscoa em Garizim, segundo a Lei.

A Salvação vem dos Judeus
Aqui, Jesus identifica-se com os Judeus e diferencia-se dos Samaritanos.
Ele insiste no facto de que o Messias Salvador virá do povo judeu. Mas, logo a seguir, ultrapassa a oposição entre os dois povos e os seus dois lugares santos: deve-se adorar o Pai em espírito e verdade.



No centro: Jesus, o Messias
A mulher progride na descoberta de Jesus. Impulsivamente, começa por perguntar a este Judeu (reconhecido pelo seu sotaque?): «Porventura és mais do que o nosso patriarca Jacob?» Depois do diálogo sobre o marido, em que Jesus revela as suas feridas secretas, ela conclui: «Vejo que és profeta!» Por fim, ela afirma a sua esperança na vinda de um Messias. Nesse momento, Jesus apenas tem que completar: «Sou Eu, que estou a falar contigo», relembrando as palavras com que Deus se revela a Moisés (Ex 3,14). Logo a seguir, a mulher irá partilhar a descoberta com os seus vizinhos: «Não será Ele o Messias?» (v. 29) e a narrativa terminará com a confissão de fé dos Samaritanos: «Ele é verdadeiramente o Salvador do mundo» (v. 42).

As palavras com duplo sentido
João gosta de relatar detalhes históricos que têm um sentido simbólico, ou ainda de empregar palavras com duplo sentido. A fadiga de Jesus, depois da caminhada ao sol, é um sinal concreto da sua humanidade. Ao meio-dia (a sexta hora) é a hora da luz plena: Jesus derrama luz sobre toda a vida privada desta mulher e revela-se a ela. Jesus tem sede: não apenas de beber, mas também de partilhar o dom de Deus, «a água viva» que apenas Ele pode dar e que é o Espírito Santo (cf. Jo 7,37-39). O alimento que os discípulos trarão, dará origem a um outro quiproquó: «O alimento é fazer a vontade daquele que me enviou» (vv. 31-34).

As Escrituras
A narrativa de João está impregnada pelas Escrituras. A mulher sabe que vem tirar água do poço do seu antepassado Jacob. Ora, o poço evoca particularmente encontros amorosos, porque aí os homens podem falar com as mulheres que vêm buscar água todos os dias. Foi perto de um poço, que o servo de Abraão encontrou Rebeca (Gn 24,15-27), Jacob conheceu Raquel (Gn 29,1-14) e Moisés, a sua futura mulher (Ex 2,15-22). Durante o Êxodo, cantava-se acerca de um poço misterioso que acompanhava Israel e simbolizava também a Lei de Deus, a Tora, fonte de vida (Nm 21,16-18); a tradição judaica chama a este poço: «O Dom da Lei». E o Espírito Santo não é, também Ele, este «Dom de Deus» (v. 10)?

A Igreja em filigrana
Esta narrativa de João contém uma catequese sobre a vida cristã. A água viva, «fonte a jorrar para a vida eterna», é o Espírito Santo, que o Ressuscitado dará aos seus discípulos (cf. Jo 7,37-39). «Adorar o Pai em espírito e verdade» é, exatamente, o que Jesus propõe aos seus discípulos: para além do culto no Templo e na sinagoga, de agora em diante, os cristãos adoram Deus, como Pai de Jesus, nas suas casas. De acordo com os Atos dos Apóstolos, a primeira missão teve lugar na Samaria: Pedro e João aí foram enviados para levar o Espírito Santo aos Samaritanos, como no Pentecostes (At 8,14-17).




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