Se Francisco pudesse escolher, Tolentino seria o próximo Papa
1. O jornal online “7 Margens”, sempre bem informado sobre a Igreja Católica, noticiou hoje (23/09) que José Tolentino de Mendonça será “ministro” da Cultura e Educação do Vaticano.
Um cargo esmagador para o cardeal português que o Papa Francisco escolheu para ser uma das suas sombras. Tolentino era o guardião da biblioteca da Santa Sé, o guardião dos segredos, dos livros proibidos, dos pecados e iluminações da Igreja.
E agora isto.
Tolentino, o grande poeta Tolentino de Mendonça, filho de um pescador humilde de Machico, filho da pobreza e do mar alto, tornou-se o ideólogo da Igreja, o cardeal que terá a seu cargo uma rede de escolas e milhões de alunos.
2. Ainda me lembro do dia em que o Papa o fez cardeal.
Tolentino, reclinado perante Francisco, perguntou-lhe: “Santo Padre, o que me fez?”.
Sabem o que Francisco respondeu?
“José, tu és a poesia”.
E Tolentino continua a escrever poemas.
Mas continua também a ser um habitante do silêncio, continua a procurá-lo para se proteger do chinfrim do mundo, da balbúrdia.
José, o poeta que nunca parou de subir a montanha e que nunca deixou de se sentir uma criança a atravessar o mundo – tal e qual como no dia em que saiu de casa para nunca mais regressar.
3. Tolentino ocupará um lugar novo, o de Prefeito do Dicastério para a Cultura e Educação na Santa Sé, um cargo que não existia e parece ter sido desenhado para ele.
O filho do pescador que está mais próximo de um dia, quem sabe, ser um pescador de homens.
O filho de um pescador que continua em plena viagem.
Como nós.
Como tu que me ouves ou lês, mesmo que não acredites em Deus.
Estamos todos num comboio sem saber o destino ou as estações onde poderemos sair.
4. E Deus, Tolentino?
Como o ver se somos cegos?
Como o ouvir se somos surdos?
Como lhe tocar se os nossos dedos continuam sem sensibilidade?
Tens a certeza de que existe?
Absoluta certeza de que existe fora das palavras dos poetas?
Diz-me que sim e eu acreditarei.
Que mundo é este?
Que barulho é este, Tolentino?
Escrevo-te daqui para aí. Espero que te chegue.
E não me esqueço do que me contaste em casa do Bernardo e da Isabel, nossos amigos comuns.
Lembras-te?
Quando conheceste o Papa Francisco e ele te perguntou num retiro: “Sr. Padre Tolentino, quando puder acha que me pode conceder uns minutos?”.
E tu respondeste, “Santo Padre, eu é que lhe tenho de pedir uns minutos”.
Foi ele quem se dirigiu ao teu quarto.
E falaram de poesia de Borges e Pessoa.
E de Deus.
O comboio acabara de parar para tu saíres, era a tua estação.
Mas agora é que as sombras serão perigosas.
E hoje que te celebro será a última vez que te tratarei por tu. Afinal, és filho de um pescador e trazes já muito peixe na rede.
Um mar alto que é também deserto.
Que nos próximos três dias afugentes o inferno.
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