Catequese sobre os Atos dos Apóstolos #06
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
A comunidade cristã nasce da superabundante efusão do Espírito Santo e cresce graças ao fermento da partilha entre irmãos e irmãs em Cristo. Há um dinamismo de solidariedade que constrói a Igreja como família de Deus, onde a experiência da koinonia é central. Que significa esta palavra estranha? É uma palavra grega que significa «pôr em comum», «partilhar», ser uma comunidade, não se isolar. Esta é a experiência da primeira comunidade cristã, isto é, pôr em comum, «partilhar», «comunicar, participar», não isolar-se. Na Igreja das origens, esta koinonia, esta comunidade refere-se sobretudo à participação no Corpo e Sangue de Cristo. Por esta razão, quando fazemos comunhão declaramos, “comunicamos”, entramos em comunhão com Jesus e desta comunhão com Jesus chegamos à comunhão com os nossos irmãos e irmãs. E esta comunhão com o Corpo e Sangue de Cristo que se faz na Santa Missa, traduz-se em união fraterna, e portanto também com o que é mais difícil para nós: partilhar os bens e recolher dinheiro para a coleta a favor da Mãe Igreja de Jerusalém (cf. Rm 12, 13; 2 Cor 8-9) e para as outras Igrejas. Se quiserdes saber se sois bons cristãos, deveis orar, procurar aproximar-vos da comunhão, do sacramento da reconciliação. Mas o sinal de que o vosso coração se converteu é quando a conversão chega aos vossos bolsos, quando toca o vosso interesse: é nisso que se vê se alguém é generoso com os outros, se alguém ajuda os mais débeis, os mais pobres: quando a conversão chegar lá, tendes a certeza de que é uma verdadeira conversão. Se permanecer apenas em palavras, não é uma boa conversão.
A vida eucarística, as orações, a pregação dos Apóstolos e a experiência de comunhão (cf. At 2, 42) fazem dos crentes uma multidão de pessoas que têm — diz o Livro dos Actos dos Apóstolos — «um só coração e uma só alma» e que não consideram sua propriedade aquilo que possuem, mas conservam tudo em comum (cf. At 4, 32). É um modelo de vida tão forte que nos ajuda a ser generosos e não avarentos. Por isso, «entre eles não havia ninguém necessitado, pois todos os que possuíam terras — diz o Livro — ou casas vendiam-nas, traziam o produto da venda e depositavam-no aos pés dos Apóstolos. Distribuía-se, então, a cada um conforme a necessidade que tivesse» (At 4, 34-35). A Igreja sempre teve este gesto dos cristãos que se despojavam das coisas que tinham a mais, das coisas que não eram necessárias para dar aos necessitados. E não apenas dinheiro, mas tempo. Quantos cristãos — vocês, por exemplo, aqui na Itália — quantos cristãos são voluntários! Mas isto é lindo! É comunhão, partilhar o meu tempo com os outros, ajudar os necessitados. E assim o voluntariado, as obras de caridade, as visitas aos doentes; devemos sempre partilhar com os outros, e não apenas procurar o nosso próprio interesse.
A comunidade, ou koinonia, torna-se assim o novo modo de relacionamento entre os discípulos do Senhor. Os cristãos experimentam um novo modo de estar entre si, de se comportar. E é o modo próprio do cristão, a ponto de os pagãos olharem para os cristãos e dizerem: «Vede como se amam»! O amor era o caminho. Mas não amor de palavras, não amor falso: amor de obras, de ajuda mútua, amor concreto, concretude do amor. O vínculo com Cristo estabelece um vínculo entre irmãos que converge e se expressa também na comunhão dos bens materiais. Sim, essa forma de estar juntos, esse amor que vai até aos bolsos, chega a despojar-se do dinheiro para o dar aos irmãos, indo contra o próprio interesse. Ser membros do Corpo de Cristo torna os crentes co-responsáveis uns pelos outros. Ser crentes em Jesus torna-nos todos co-responsáveis uns pelos outros. «Mas olha para aquele, o problema que tem, não me interessa, que se arranje». Não, entre cristãos não podemos dizer: «Pobre homem, tem um problema em casa, está a passar por esta dificuldade familiar». Mas, devo rezar, levo-o comigo, não fico indiferente». Isto é ser cristão. Por isso os fortes sustentam os fracos (cf. Rm 15, 1) e ninguém experimenta a pobreza que humilha e desfigura a dignidade humana, porque vivem esta comunidade: ter o coração em comum. Eles amam-se. Este é o sinal: amor concreto.
Tiago, Pedro e João, os três apóstolos que são as «colunas» da Igreja de Jerusalém, estabelecem de modo comum que Paulo e Barnabé evangelizem os pagãos enquanto evangelizam os judeus, e perguntam apenas a Paulo e Barnabé qual é a condição: não esquecer os pobres, recordar os pobres (cf. Gl 2, 9-10). Não só os pobres materiais, mas também os pobres espirituais, as pessoas que têm problemas e precisam da nossa proximidade. Um cristão parte sempre de si mesmo, do seu próprio coração, e aproxima-se dos outros como Jesus se aproximou de nós. Era assim a primeira comunidade cristã.
Um exemplo concreto da partilha e da comunhão dos bens vem-nos do testemunho de Barnabé: ele possui um campo e vende-o para entregar os proventos aos Apóstolos (cf. At 4, 36-37). Mas, ao lado do seu exemplo positivo, aparece outro, infelizmente negativo: Ananias e a sua esposa Safira, venderam um pedaço de terra, decidiram entregar apenas uma parte aos Apóstolos e guardar a outra para si mesmos (cf. At 5, 1-2). Este engano rompe a cadeia da partilha livre, da partilha serena, altruísta e as consequências são trágicas, fatais (At 5, 5.10). O apóstolo Pedro desmascarou a má conduta de Ananias e de sua esposa e disse-lhe: «Por que é que Satanás invadiu o teu coração, a ponto de te levar a mentir ao Espírito Santo e subtraíres uma parte do terreno? Não foi aos homens que tu mentiste, mas a Deus» (At 5, 3-4). Poderíamos dizer que Ananias mentiu a Deus por causa de uma consciência isolada, uma consciência hipócrita, isto é, por causa de uma pertença eclesial “negociada”, parcial e oportunista. A hipocrisia é o pior inimigo desta comunidade cristã, deste amor cristão: aquele fingir que se amam uns aos outros, mas procurar apenas o próprio interesse.
Falhar na sinceridade da partilha, de facto, ou falhar na sinceridade do amor, é cultivar a hipocrisia, distanciar-se da verdade, tornar-se egoísta, apagar o fogo da comunhão e destinar-se ao gelo da morte interior. Aqueles que se comportam assim passam pela Igreja como turistas. Há muitos turistas na Igreja que estão sempre de passagem, mas nunca entram na Igreja: é o turismo espiritual que os faz acreditar que são cristãos, enquanto são apenas turistas nas catacumbas. Não, não devemos ser turistas na Igreja, mas irmãos uns dos outros. Uma vida baseada unicamente em tirar proveito e vantagem de situações em detrimento de outros, provoca inevitavelmente a morte interior. E quantas pessoas dizem que frequentam a Igreja, que são amigos de sacerdotes, bispos, mas procuram apenas o seu próprio interesse. Estas são as hipocrisias que destroem a Igreja!
O Senhor — peço-o para todos nós — derrame sobre nós o seu Espírito de ternura, que supera qualquer hipocrisia e põe em circulação aquela verdade que alimenta a solidariedade cristã, a qual , longe de ser uma actividade de assistência social, é a expressão indispensável da natureza da Igreja, a terna mãe de todos, especialmente dos mais pobres.
Catequese do Papa Francisco
21 de Agosto de 2019
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