A partida que nos envia
Há momentos em que a ausência não empobrece, mas revela. Não nos rouba, mas expande-nos. A Ascensão do Senhor é precisamente isso, o instante paradoxal em que o Céu se inscreve na Terra não como um adeus, mas como uma promessa.
Jesus parte. Ou melhor, deixa de estar ao alcance dos nossos olhos para habitar a profundidade dos nossos corações. E o que parece um afastamento, é, na verdade, a mais íntima das presenças. Eleva-se aos Céus, mas não como quem abandona, antes como quem inaugura um modo novo de estar, mais interior, mais total, mais fecundo.
Como escreveu São Leão Magno, “a Ascensão do Senhor é a exaltação da nossa humanidade”¹. Cristo leva consigo, na sua subida, a nossa carne, as nossas histórias, as nossas feridas. Ele não sobe sozinho, leva-nos com Ele. E, ao fazê-lo, abre-nos à esperança de que a nossa peregrinação também conhecerá o horizonte da plenitude.
Mas há mais. Na montanha da Ascensão - onde o céu toca a terra e a terra ousa olhar para o alto - somos enviados. Não para ficarmos paralisados na contemplação do mistério, mas para vivê-lo no concreto dos dias. “Ide, fazei discípulos todos os povos”², diz-nos o Ressuscitado. A missão começa quando aceitamos que o amor não se guarda, transmite-se. Quando deixamos de perguntar "onde está o Senhor?" para começarmos a sê-lo, na humildade do serviço, na ousadia da fé, na paciência da caridade.
A Ascensão é também o tempo do Espírito. De um Deus que não está ausente, mas presente de um outro modo. Invisível, sim, mas não inoperante. Em cada gesto de ternura, em cada luta por justiça, em cada semente de Evangelho lançada ao vento, Ele continua a descer. Continua a fazer-se carne. Continua a viver em nós.
A nós, que ainda olhamos o céu com uma mistura de espanto e nostalgia, a Ascensão recorda que o Céu começa aqui. Quando deixamos que Deus habite os nossos passos. Quando nos tornamos, uns para os outros, sinais de uma presença que salva.
¹ São Leão Magno, citado em: Vatican News – A Ascensão na doutrina de São Leão Magno
² Evangelho segundo São Mateus 28, 19: Comentário litúrgico – Vatican News
Ana Conde
Catequese e Família
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